Você acredita em tudo que pensa?

Como transformar pensamentos em hipóteses, e não em sentenças absolutas.

A mente humana é um espetáculo curioso. Ela nos presenteia com ideias brilhantes — como a roda, o fogo e o chocolate — mas também é capaz de criar cenários de desastre tão convincentes que fariam qualquer roteirista de drama suspirar de inveja. E o mais intrigante é que acreditamos nesses roteiros internos quase sempre sem questionar.

O problema é simples: tratamos cada pensamento como um fato consumado, quando na realidade muitos deles são apenas opiniões do cérebro. A psicologia cognitiva já mostrou isso de forma bem clara. Aaron Beck, o criador da Terapia Cognitiva, demonstrou que nossos pensamentos automáticos podem distorcer a percepção da realidade (Beck, 1979). Não se trata de sermos irracionais o tempo todo — é só que a mente tem o hábito incômodo de dramatizar.

Por exemplo, pense naquela apresentação de trabalho. Surge o pensamento:
— “Se eu errar, vai ser um desastre, todos vão perceber e vou ser motivo de piada.”
A realidade, segundo estudos sobre memória social, é que as pessoas raramente lembram detalhes de falhas alheias, porque estão ocupadas demais pensando… em si mesmas (Baumeister & Masicampo, 2010).

A pesquisa em mindfulness também reforça essa ideia: quando conseguimos observar os pensamentos sem reagir automaticamente a eles, reduzimos sintomas de ansiedade e depressão (Keng, Smoski & Robins, 2011). Em outras palavras, se tratarmos a mente como uma máquina de sugestões, em vez de uma emissora de verdades absolutas, ficamos emocionalmente mais livres.

É aqui que entra a pergunta crucial: você precisa acreditar em tudo que pensa?
A resposta baseada em evidência é um sonoro não. Pensamentos são hipóteses, não sentenças. Eles merecem ser observados, testados, avaliados. Alguns se provam úteis, outros não.

Então, da próxima vez que surgir aquela voz mental dizendo:
— “Vai dar tudo errado.”
Experimente responder:
— “Obrigado, querido cérebro, vou considerar sua previsão junto com a meteorologia e o horóscopo de hoje.”

Esse espaço entre pensar e acreditar é, segundo a ciência, um dos pilares da saúde mental.


Psicólogo Gustavo Henrique

Referências:

BECK, Aaron T. Cognitive therapy of depression. New York: Guilford Press, 1979.

BAUMEISTER, Roy F.; MASICAMPO, E. J. Conscious thought is for facilitating social and cultural interactions: How mental simulations serve the animal–culture interface. Psychological Review, v. 117, n. 3, p. 945-971, 2010.

KENG, Shian-Ling; SMOSKI, Moria J.; ROBINS, Clive J. Effects of mindfulness on psychological health: A review of empirical studies. Clinical Psychology Review, v. 31, n. 6, p. 1041-1056, 2011.

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Gustavo Henrique

Prazer, sou Gustavo Henrique, psicólogo clínico com mais de 4 anos de experiência. Minha jornada na faculdade começou com um interesse crescente por uma psicologia mais científica. Fiz minha primeira pós-graduação em Análise Comportamental Clínica pelo Instituto Brasiliense de Análise do Comportamento (IBAC) e, em seguida, concluí uma pós em Terapia Cognitiva Comportamental pela PUCRS. Trabalhei como psicólogo hospitalar e, posteriormente, em uma comunidade terapêutica. Além disso, atuei como supervisor em terapia ABA com crianças autistas. Atualmente, concentro meus estudos e práticas nas áreas de neurociência e psicologia baseada em evidências, e sou membro da Associação Brasileira de Psicologia Baseada em Evidência.

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Gustavo Henrique | Psicólogo Clínico CRP 08/32842

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