Tecnologia e habilidades sociais: a geração do “zap” está desaprendendo a interagir?

O que a literatura realmente mostra sobre redes sociais, comunicação digital e competência social.

Imagine a cena: você tá numa roda de amigos e alguém fala uma piada. Em vez de rir, você solta um “KKKK” alto, como se fosse natural. Parece engraçado, mas isso já acontece! A pergunta é: a tecnologia está mesmo prejudicando nossas habilidades sociais ou isso é só drama da geração que ainda usava SMS pago?

A literatura científica mostra que a coisa é um pouco mais complexa. Pesquisas indicam que as redes sociais podem, sim, facilitar conexões e manter relacionamentos que seriam perdidos pela distância (Valkenburg; Peter, 2011). Porém, o uso excessivo e sem critérios está associado a menos habilidades de comunicação face a face, maior evitação social e até aumento da solidão (Twenge; Campbell, 2019).

Em outras palavras: o zap ajuda você a manter contato com aquele amigo da quinta série que virou coach de criptomoeda, mas pode deixar você travado quando precisa puxar papo com o colega no trabalho.

Outro ponto importante: não é a tecnologia em si que “rouba” nossas habilidades sociais, mas como usamos. Interações online podem gerar reforço social imediato (curtidas, coraçõezinhos, figurinhas do Neymar chorando), mas esse tipo de reforço não substitui a prática real de lidar com olhares, pausas constrangedoras e até a arte de puxar assunto sobre o clima (Subrahmanyam; Šmahel, 2011).

Então, não: a geração do zap não está desaprendendo a interagir. Mas está, sim, trocando treino real por treino digital — e aí a transferência de habilidade pode não ser tão automática. É como achar que jogar Guitar Hero te prepara pra um show ao vivo.

Dica prática baseada em ciência

Se você quer equilibrar, tente a regra dos “3 encontros”: a cada 3 interações sociais digitais, se proponha a ter 1 conversa presencial ou ao menos por chamada de vídeo. Isso aumenta a chance de treinar as micro-habilidades da comunicação real (contato visual, turn-taking, leitura de expressão facial) que não aparecem no zap.

Gustavo Henrique Ferreira
Psicólogo | Psicologia Baseada em Evidências

Referências

  • SUBRAHMANYAM, K.; ŠMAHEL, D. Digital Youth: The Role of Media in Development. New York: Springer, 2011.
  • TWENGE, J. M.; CAMPBELL, W. K. The Narcissism Epidemic: Living in the Age of Entitlement. New York: Atria Books, 2019.
  • VALKENBURG, P. M.; PETER, J. Online communication and adolescent well-being: Testing the stimulation versus the displacement hypothesis. Journal of Computer-Mediated Communication, v. 16, n. 2, p. 200–209, 2011.

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Gustavo Henrique

Prazer, sou Gustavo Henrique, psicólogo clínico com mais de 4 anos de experiência. Minha jornada na faculdade começou com um interesse crescente por uma psicologia mais científica. Fiz minha primeira pós-graduação em Análise Comportamental Clínica pelo Instituto Brasiliense de Análise do Comportamento (IBAC) e, em seguida, concluí uma pós em Terapia Cognitiva Comportamental pela PUCRS. Trabalhei como psicólogo hospitalar e, posteriormente, em uma comunidade terapêutica. Além disso, atuei como supervisor em terapia ABA com crianças autistas. Atualmente, concentro meus estudos e práticas nas áreas de neurociência e psicologia baseada em evidências, e sou membro da Associação Brasileira de Psicologia Baseada em Evidência.

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Gustavo Henrique | Psicólogo Clínico CRP 08/32842

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