Um guia não muito confiável — mas cientificamente fundamentado — para lidar com o desconforto inevitável da vida
Você já percebeu como o cérebro humano é um sujeito preguiçoso? Não preguiçoso do tipo “não vou levantar da cama hoje” — mas preguiçoso do tipo “vou gastar o mínimo de energia possível para não enlouquecer com esse universo caótico”. Por isso, quando alguém fala em mudança, o cérebro dá aquele grito interno: “Pelo amor de Darwin, não mexe aí!”.
Só que tem um detalhe incômodo (e cientificamente irritante): ficar parado também dói. É como estar preso numa cadeira desconfortável no cinema — levantar vai incomodar, mas ficar até o fim do filme pode ser ainda pior.
De acordo com a Terapia de Aceitação e Compromisso (Hayes et al., 1999), fugir de experiências dolorosas só aumenta o sofrimento no longo prazo. Em outras palavras, quando você evita o desconforto da mudança, acaba assinando um contrato vitalício com o desconforto de não mudar. E, sinceramente, esse não é o tipo de plano de fidelidade que você quer na sua vida.
Já a Psicologia Positiva (Seligman, 2011) e a Terapia Cognitivo-Comportamental (Beck, 2011) mostram algo quase óbvio (mas que a gente insiste em esquecer): quando a gente encara novos desafios, aprende novas habilidades e cria novos significados, a vida ganha camadas. É como atualizar o sistema operacional do cérebro — demora, trava, dá raiva, mas no fim você descobre que agora dá para usar emojis animados.
Então, sim, mudar dói. Mas ficar parado também. A diferença é que a dor da mudança é como aquela dor muscular pós-academia: chata, mas que sinaliza crescimento. Já a dor de ficar parado é como dor de dente: só piora, e cedo ou tarde vai exigir algo bem mais desagradável.
Em resumo, se a vida é um ônibus interestelar (e aqui peço licença poética ao grande Douglas Adams), mudar é pegar um assento novo: talvez você fique ao lado de alguém esquisito, mas pelo menos terá uma nova paisagem pela janela. Ficar parado é continuar sentindo o cheiro do mesmo passageiro que abriu um pacote de salgadinho às 7 da manhã.
Gustavo Henrique
Psicólogo | Psicologia Baseada em Evidências
Referências
- BECK, J. S. Terapia Cognitivo-Comportamental: teoria e prática. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2011.
- HAYES, S. C.; STROSAHL, K.; WILSON, K. G. Acceptance and Commitment Therapy: An Experiential Approach to Behavior Change. New York: Guilford Press, 1999.
- SELIGMAN, M. E. P. Flourish: A visionary new understanding of happiness and well-being. New York: Free Press, 2011