Por que o silêncio não é um vazio assustador, mas um encontro necessário (e o que o seu cérebro faz quando você finalmente para).
Olá, leitor,
Vou começar esta newsletter com uma pequena confissão.
Embora eu seja psicólogo e meu trabalho seja, essencialmente, ouvir e processar histórias, eu também canso. Às vezes, chego ao final do dia com a sensação de que meu “disco rígido” está cheio. Nesses momentos, a tentação de pegar o celular e rolar o feed infinitamente é gigante. É quase um reflexo: buscar uma distração para não ter que lidar com o barulho residual da minha própria mente.
Você já percebeu como nos tornamos intolerantes ao tédio?
Se estamos na fila do mercado, puxamos o celular. Se estamos dirigindo, ligamos o podcast. Se estamos lavando louça, precisamos de um vídeo de fundo. Parece que desenvolvemos um medo coletivo do silêncio, como se ficar a sós com nossos pensamentos fosse perigoso.
Mas o que acontece quando o barulho para?
A neurociência tem uma explicação fascinante para o que acontece quando “não fazemos nada”.
Durante muito tempo, achava-se que o cérebro simplesmente “desligava” quando não estávamos focados em uma tarefa. Hoje sabemos que acontece o oposto. Quando você se permite o devaneio, o silêncio e o tédio, uma rede específica do cérebro assume o comando: a Default Mode Network (Rede de Modo Padrão).
É nessa rede que a mágica acontece. É o momento em que o cérebro sai do modo “reação” (respondendo a e-mails, desviando do trânsito, processando likes) e entra no modo “integração”. É ali que consolidamos memórias, conectamos ideias distantes, processamos emoções complexas e construímos nossa narrativa autobiográfica.
Basicamente, é no silêncio que você se torna quem você é.
Dopamina barata x Descanso real
O problema é que trocamos esse processo vital pela dopamina rápida das telas. Quando evitamos o silêncio, estamos roubando do nosso cérebro a chance de se organizar. O resultado não é descanso, é uma exaustão mental crônica. Ficamos cheios de informações, mas vazios de sentido.
Estar sozinho não precisa ser sinônimo de solidão.
- Solidão é a dor de estar isolado.
- Solitude é a glória de estar bem na própria companhia.
Um convite à pausa
Não vou passar uma “tarefa de casa” complexa hoje. Meu convite é mais simples e, talvez, mais desafiador: experimente o silêncio.
Pode ser apenas tomar o café da manhã sem o celular na mesa. Ou dirigir os primeiros 10 minutos sem rádio. Ou apenas sentar no sofá e olhar pela janela, deixando a mente vagar para onde ela quiser.
No início, pode ser desconfortável. A mente vai chiar, vai cobrar produtividade, vai buscar distrações. Mas se você sustentar esse momento, o ruído baixa. E o que sobra é você.
E garanto: você é uma companhia muito mais interessante do que o algoritmo do Instagram.
Um abraço (silencioso),
Gustavo Henrique Ferreira
Psicólogo Clínico
Membro da Associação Brasileira de Psicologia Baseada em Evidências (ABPBE)